Tecnicamente falando o Google tem mais de 20 anos, mas ninguém sabe precisar o momento exato em que ele começou. Teria sido em 1995, quando Larry Page (23 anos) e Sergey Brin (22 anos) se conheceram nos corredores da universidade norte-americana de Stanford, mas não simpatizaram de imediato um com o outro? Ou teria sido em janeiro de 1996 quando a dupla já estava antenada o bastante para começar a trabalhar junto em um “projetinho” inicialmente chamado de BackRub e que iria mudar a forma como interagimos com a internet, com a publicidade, com dispositivos móveis e mais? Ou quando o domínio google.com foi registrado pela primeira vez, em setembro de 1997?

Para todos os fins, a data mais aceita é a data de 4 de setembro de 1998, quando o projeto de estudantes de graduação se tornou uma empresa registrada, a Google Inc., dando início a um império de tecnologia que se expandiria e muito pelas duas décadas que viriam.

Do campus para o mundo

O famoso paper original que definiria o algoritmo do Google (e disponível até hoje hospedado nos servidores de Stanford) é uma das peças matemáticas mais influentes do século e nasceu a partir de uma constatação genial: relevância em resultados de buscas não é algo que constrói, mas algo que se conquista. Enquanto buscadores de sucesso no final dos anos 90 se baseavam na análise do que estava escrito na página, avaliando o peso da presença de palavras-chave e sendo facilmente iludidos por parâmetros META falsificados e repetições embutidas, o Google pensava fora da caixa:

O PageRank trabalha contando o número e a qualidade dos links para uma página para determinar uma estimativa aproximada da importância do site. O pressuposto subjacente é que sites mais importantes provavelmente receberão mais links de outros sites.

Embora o conceito de PageRank tenha sido manipulado, modificado, manipulado novamente e novamente modificado ao ponto de se tornar quase obsoleto nas engrenagens do mecanismo de busca, na época do seu lançamento ele foi o diferencial que garantiria a hegemonia na internet para o projeto de Brin e Page.

Mas esse foi um processo lento. Muito lento.

Nos seus primórdios, o Google funcionava no endereço google.stanford.edu e a rede de dados acadêmica era capaz de dar conta do volume de pesquisas efetuada. Se essa informação parece inacreditável quando pensamos no alcance do volume do Google de hoje, o que dizer do primeiro “data center” do mecanismo de busca, construído no dormitório de Larry Page e usando um gabinete feito de Legos?

Sim, o Google funcionava aqui.

Com tudo testado e funcionando, a dupla de empreendedores iniciou a parte mais difícil de seu projeto: obter um financiamento para expandir. Page e Brin por um lado tiveram a sorte de ter um produto poderoso em mãos em um momento em que a bolha da internet estava no seu ápice e capital fluía na direção de qualquer projeto com uma mínima chance de retorno. Por outro lado, eles tinham o azar de ter um produto que não era nem chamativo nem fácil de explicar. Enquanto lojas virtuais que abusavam de Flash e 3D conseguiam milhões de dólares, o Google encontrava somente portas fechadas.

David Filo, um dos fundadores do Yahoo, declarou explicitamente que gostou do que viu, mas que os dois rapazes deveriam procurá-lo novamente somente quando o Google estivesse mais maduro. Três anos depois, o Google se tornaria o mecanismo de busca padrão do Yahoo e cinco anos depois a empresa ofereceria 3 bilhões pela compra do Google e seria esnobada.

Entretanto, Filo não estava sozinho em sua rejeição. Doug Cutting, arquiteto sênior do mecanismo de busca Excite, afirmou: “eu não fiquei nem um pouco impressionado com a demonstração deles”. “Eu falei para eles catarem cavacos”, declarou Steve Kirch, fundador do InfoSeek. Nenhuma destas ferramentas de busca sobreviveria mais uma década sobre o domínio do Google.

Sergei Brin e Larry Page não se deixaram abater. Prepararam um plano de negócios, criaram um nome fictício de empresa e resolveram bater diretamente na porta de investidores. Se não podiam vender sua tecnologia para mecanismos de busca já estabelecidos, eles iriam criar seu próprio buscador. Deram a sorte de encontrar Andy Bechtolsheim, um dos fundadores da Sun e um poderoso investidor na época. Reza a lenda que Bechtolsheim estava com pressa para outro compromisso e não podia assistir a demonstração inteira, então assinou um cheque de 100 mil dólares em nome da Google Inc e prometeu discutir os detalhes depois.

Nesse momento, não havia Google Inc alguma e o cheque ficou um bom tempo parado na gaveta. A tal discussão de detalhes tampouco aconteceu, mas o primeiro passo havia sido dado. O capital inicial acabou sendo levantado com amigos e parentes e a dupla fundou a Google Inc em 4 de setembro de 1998 e se mudou dos dormitórios de Stanford… para uma garagem desocupada no Vale do Silício.

Naquela primeira semana de setembro, vinte anos atrás, a revista PC Magazine publicou uma matéria de capa dedicada aos “portais mais quentes da internet”. Nomes como Altavista, Excite, Infoseek, Lycos e Netcenter eram elogiados por seus recursos de busca e muitos eram glorificados como a página inicial de internet de muitos usuários. Google não era sequer mencionado na matéria e nem poderia, mas o tempo determinaria qual página acabaria sendo o ponto de partida de milhões de usuários do Chrome, o navegador mais popular dos dias atuais.

Mesmo o jornal Stanford Daily só dedicaria espaço para o mais famoso buscador de seus alunos um ano depois, em uma edição de 1999.

A “próxima grande start-up de Internet de Stanford”? Com certeza.

Google e eu

Eu ainda lembro quando tive meu primeiro contato com o Google, em algum momento do ano 2000, quando um colega de trabalho mostrou para a gente um mecanismo de busca “novo” muito mais rápido que os demais. Em uma sala de escritório, com profissionais de TI de diferentes bagagens, diferentes experiências de vida e formações, apenas um conhecia esse tal de Google. Mas, daquele momento em diante, todos aderiram em peso ao novo buscador.

É preciso entender que naquela época era comum você digitar um termo de pesquisa no Altavista ou no Yahoo e precisar aguardar vários segundos por um retorno de resultado. É algo inadmissível na web moderna, mas era assim que funcionava. Então, a primeira coisa que se destacou no Google foi sua velocidade: você digitava a busca e o resultado aparecia “na hora”. Relevância era algo que descobrimos depois, mas a velocidade foi o que nos convenceu. O algoritmo de Brin e Page era capaz de recuperar respostas muito mais rápido que a concorrência.

É claro que houve um período que o Google estava infestado de spam. Webmasters aprenderam a manipular seus resultados e pornografia abundava, assim como o famigerado google bombing. Mas outro detalhe que afastava o Google dos demais era que seu algoritmo não era e não é algo estático gravado em pedra. Ele está em constante evolução para oferecer resultados que seguem impressionando vinte anos depois. Ele aprendeu a interpretar contexto, aprendeu (para o bem ou para o mal) a customizar respostas de acordo com o usuário que as pergunta, derrubou sites, levantou sites, em uma dança que tornou o SEO uma complicada mistura de ciência e adivinhação.

É difícil imaginar a web sem o Google atualmente. Seu principal concorrente, o Bing, se esforça, mas seus resultados ainda trazem um ranço de imprecisão. Há alternativas ao buscador do Google, mas ele segue em sua hegemonia e “taca no Google” se incorporou ao nosso vocabulário.

Enquanto empresa, a Google Inc se tornou um gigante muito distante de suas origens modestas. Muitos diriam que também se tornou muito distante do seu lema original: o simples, mas efetivo “não seja maligno”. Com ligações estranhas com o desenvolvimento de Inteligência Artificial militar e com funcionários atuando como consultores do Pentagono ou do governo norte-americano, não estamos mais falando de um projeto acadêmico.

Mas a busca… bem, essa permanece impressionando.

Cronologia de um colosso

1998: Bechtolsheim não foi o único investidor no começo do Google e Brin e Page também conseguiram somar mais de US $ 1 milhão com a ajuda do professor de Stanford David Cheriton e Ram Shriram (do comando executivo da Netscape). Jeff Bezos, da Amazon, também apostou suas fichas na empresa.

1999: Já com US$ 25 milhões em seus cofres, o Google sai da garagem de Susan Wojcicki e se muda para Mountain View, na Califórnia. Uma negociação de venda para a Excite fracassa diante da oferta baixa.

2000: O Google assume o mecanismo de busca do Yahoo. O primeiro Doodle vai ao ar, celebrando o festival cultural The Burning Man.

2001: Eric Schmidt, ex-chefão da Sun Microsystems, se junta ao Google no cargo de presidente. Mais tarde assumiria a posição de CEO.

2002: Lançamento do Google News. No mesmo ano, o Yahoo tenta comprar a empresa por 3 bilhões de dólares, mas a oferta é recusada.

2003: Google adquire o Blogger, um dos primeiros promotores de blogs e hospedagem de blogs. A empresa também lança o Google AdSense, que se tornaria um gigante no mercado publicitário e uma das principais fontes de faturamento por anos a fio.

2004: IPO do Google levanta US$ 1,67 bilhão. No mesmo ano, é inaugurado o Gmail, um serviço de webmail que trazia 1GB de espaço de armazenamento, cerca de 100 vezes o padrão oferecido na época. Esse armazenamento seria dobrado no ano seguinte.

2005: Com o surgimento do Google Maps e do Google Earth, a empresa entra com força total no mercado de mapeamento. Em uma nova oferta pública de ações, são arrecadados mais US$ 4 bilhões.

2006: O ano marca a aquisição do YouTube e o lançamento do Google Docs e Spreadsheets, dois novos mercados onde a empresa atingiria uma posição singular.

2007: O sistema operacional para dispositivos móveis Android começa a ser distribuído para desenvolvedores. No mesmo ano, o Google compra a rede de publicidade online DoubleClick e amplifica o alcance de sua própria plataforma de anúncios.

2008: O navegador Chrome estreia no mercado e chega ao consumidor o primeiro smartphone equipado com o sistema Android.

2009: O Google começa o desenvolvimento de veículos autônomos.

2010: Nexus One chega ao mercado: o primeiro smartphone desenvolvido pelo Google. No mesmo ano, a empresa começa uma iniciativa para estender a oferta de acesso por fibra ótica nos Estados Unidos.

2011: Lançamento do Chromebook, baseado no sistema operacional Chrome OS. A divisão móvel da Motorola passa a fazer parte da família de empresas Google. Larry Page assume o cargo de CEO do Google.

2012: Google Glass é demonstrado pela primeira vez para o público com sua proposta de levar Realidade Ampliada para as massas.

2013: Waze é adquirido pelo Google. Chromecast é apresentado.

2014: Nest é mais uma empresa que passa a fazer parte da família Google, colocando a empresa no mercado de automação residencial.

2015: A família Google passa a ser organizada sob a holding Alphabet, Inc. Google volta a ser um nome utilizado principalmente para a divisão de buscas da empresa. Sundar Pichai assume o cargo de CEO.

2016: Google Home é o passo seguinte para conquistar o ambiente doméstico, com um assistente de Inteligência Artificial baseado em voz.

2017: A divisão de veículos autônomos, batizada de Waymo, processa o Uber, por espionagem industrial. Uber aceita um acordo para encerrar o caso na Justiça.

2018: Google é processado pela União Europeia por práticas monopolistas relacionadas ao sistema operacional Android.